Desafiando poderes coloniais na construção do conhecimento acadêmico – autoetnografia performática, corpos e subjetividades

Gustavo Antonio Raimondi, Professor da Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia, MG, Brasil

Claudio Moreira, Professor da University of Massachusetts, Amherst, MA, EUA

Nelson Filice de Barros, Professor da Universidade Estadual de Campinas, Campinas, SP, Brasil

 

 

Questionando verdades, tensionando a robotização da pesquisa e subvertendo a norma / a ordem / a regra / a teoria / o poder colonial, a autoetnografia performática se mostra como um recurso teórico e metodológico potente para vocalização de vozes sistematicamente silenciadas, negligenciadas e excluídas na academia. Na tentativa de realizar essa prática metodológica na escola médica, a qual sustenta seus discursos institucionais hegemônicos baseado na coerência biológica heteronormativa, os autores do artigo intitulado “O corpo negado pela sua ‘extrema subjetividade’: expressões da colonialidade do saber na ética em pesquisa”, publicado no periódico Interface – Comunicação, Saúde, Educação (v. 23), problematizam a colonialidade do saber na ética em pesquisa.

“Era uma vez …” um desejo de pesquisa que buscava problematizar como a formação em saúde, no caso a medicina, incluía e excluía determinados corpos, a partir de regras e padrões construídos culturalmente e reiterados pelas (in)certezas do discurso médico, relacionando-se ao campo do natural. Era preciso, então, propor reflexões sobre o corpo, não apenas como fato natural, mas a sua correlação com os corpos que (não) importam (na)para a prática médica. A fim de evitar o silenciamento das impressões, reflexões e vivências do corpo daquele que pesquisa, a autoetnografia performática foi escolhida como recurso metodológico.

Compreende-se que a autoetnografia busca problematizar as resistências entre os “eus” (auto) e o coletivo (etno) no ato de escrever (grafia). Ela é uma escrita que pede a crítica ao nível mais básico das relações, visando às estruturas opressivas em nossas vidas diárias (DENZIN, 2018). Sendo assim, a autoetnografia pode ser considerada “uma forma de saber que tem o potencial de examinar a justiça social, os sistemas de opressão e o neocolonialismo de nossos encontros com experiências vividas entre identidades e mundos” (DIVERSI; MOREIRA, 2018, p. 39). Trata-se do desaparecimento do “outro” e do eu como localizações espaço-temporal fixas, para o reconhecimento do fluxo performático do “eu-como-o-outro”, movendo-se, assim, do pessoal para o político (DENZIN, 2018).

Mas, “era uma vez …” o encontro com o parecer do Comitê de Ética em Pesquisa (CEP). Diante desse encontro, os pesquisadores encontraram em seus próprios corpos o que a “Ciência” e a Plataforma Brasil/CEP querem assegurar: a suposta “VERDADE” científica sobre um objeto de conhecimento “coerente” com os pressupostos científicos do distanciamento, da neutralidade e da coerência à natureza, que pode ser sistematicamente observada, reproduzida e generalizada.

Com isso, os autores problematizam em um texto em primeira pessoa, permeado por vários “era uma vez …”, as justificativas que sustentaram (e ainda podem sustentar) a colonialidade do saber na ética em pesquisa. Assim, eles propõem uma linguagem de pesquisa e escrita que convida os/as leitores/as a questionarem e desaprenderem o modo dominador inerente à ciência. Mas seria esse recurso possível de ser considerado um texto científico (RAIMONDI, MOREIRA, BARROS, 2019)? Essa questão é outra estória em que “era uma (outra) vez…”

Referências

DENZIN, N. K. Performance autoethnography. New York: Routledge, 2018.

DIVERSI, M.; MOREIRA, C. Betweener autoethnographies: a path towards social justice. New York: Routledge, 2018.

RAIMONDI, G. A., MOREIRA, C. and BARROS, N. F. This is (not) a scientific paper. Qualitative Inquiry, 2019. Online ISSN: 1552-7565 [reviewed 24 August 2019]. DOI: 10.1177/1077800419868510. Avaliable from:  https://journals.sagepub.com/doi/pdf/10.1177/1077800419868510

Para ler o artigo, acesse

RAIMONDI, G. A., MOREIRA, C. and BARROS, N. F. de. O corpo negado pela sua “extrema subjetividade”: expressões da colonialidade do saber na ética em pesquisa. Interface (Botucatu), v. 23, e180434, 2019. ISSN: 1414-3283 [viewed 15 October 2019].  DOI: 10.1590/interface.180434. Available from: http://ref.scielo.org/tg4fs8

Link externo

Interface – Comunicação, Saúde, Educação – ICSE: www.scielo.br/icse

 

Como citar este post [ISO 690/2010]:

RAIMONDI, G. A., MOREIRA, C. and BARROS, N. F. Desafiando poderes coloniais na construção do conhecimento acadêmico – autoetnografia performática, corpos e subjetividades [online]. SciELO em Perspectiva: Humanas, 2019 [viewed ]. Available from: https://humanas.blog.scielo.org/blog/2019/10/15/desafiando-poderes-coloniais-na-construcao-do-conhecimento-academico-autoetnografia-performatica-corpos-e-subjetividades/

 

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