Como os memes da internet conectam diferentes mundos?

Maria Carolina Zanette, Professora-pesquisadora da École Supérieure Libre des Sciences Commerciales Appliquées, Paris, França

O estudo “Viralidade intertextual e repertórios vernaculares: memes da internet como objetos conectando diferentes mundos on-line”, publicado na Revista de Administração de Empresas (v. 59, n. 3), conta a trajetória dos memes e suas principais características. Os memes são objetos que atuam como provocadores, pois são portadores de significado que refletem repertórios de comunidades fechadas, mas que adquirem novos repertórios à medida que são transmitidos entre consumidores de modo intertextual. O conceito de meme foi proposto por Richard Dawkins e abordado no livro de Susan Blackmore (2000), The meme machine. Para os autores, o meme é uma versão cultural dos genes biológicos, uma vez que pode ser transferido de pessoa para pessoa, ainda que seja modificado durante esse processo. O termo foi usado pela primeira vez no contexto on-line pelo jornalista Mark Godwin (1994) quando realizou um experimento on-line focado em fóruns de discussão.

O tema comumente é abordado em estudos sobre consumidores e marketing, especialmente sobre coletividades de consumidores e sobre o fenômeno do marketing viral e divulgação boca a boca. Dessa forma, o artigo coloca em discussão as conexões entre coletividades de consumidores on-line e suas práticas expressivas compartilhadas, como os memes. Além da análise da história dos memes da internet, literatura sobre viralidade e estudos sobre repertórios culturais e vernaculismo, como exemplo foram analisados dois casos empíricos no contexto brasileiros, os memes Inbonha e Chola Mais.

Criados informalmente em locais específicos, tais como grupos fechados e fóruns, os memes se tornaram artefatos complexos permeados de significados culturais e evoluíram paralelamente com a própria web. São utilizados pelos consumidores para disseminar ideias e mensagens por meio de imagens ou vídeos e têm como característica um padrão típico de uma mensagem justaposta com uma legenda escrita e, tanto a imagem quanto o texto, podem ser modificados durante o processo de transmissão. As mensagens geralmente são irônicas, politicamente incorretas e às vezes grotescas, o que faz com que memes sejam objetos provocadores e têm como elementos principais: vernacularismo, viralidade e intertextualidade. O repertório vernacular é uma peça fundamental do processo de comunicação (BLIKSTEIN, 2016) e refere-se ao conhecimento e referências vividas pelos indivíduos ao longo da vida. Nesse sentido, a mesma mensagem é decodificada de forma diferente entre as pessoas da comunidade local e externa ao grupo. Como exemplo nesse breve texto, tem-se o meme “Inbonha”, surgido originalmente no grupo fechado “LDRV” do Facebook (DECLERCQ, 2017), quando um membro postou a imagem (Figura 1) em que uma criança tentou escrever os nomes dos personagens da Turma da Mônica, mas os nomeou erroneamente, dando à Mônica, personagem icônico, o nome de “Inbonha”.

Figura I - Fonte: Evangelista (2016b).

Figura I – Fonte: Evangelista (2016b).

Com a viralização do meme Inbonha, ou seja, sua transmissão para outros grupos e pessoas, ocorreu a intertextualidade em que imagens ou textos são modificados, como ilustrado na Figura 2.

Figura II - Fonte: Resultado de uma pesquisa realizada no Twitter usando a palavra-chave "Inbonha".

Figura II – Fonte: Resultado de uma pesquisa realizada no Twitter usando a palavra-chave “Inbonha”.

Nota-se também que o uso de marcas nos memes corrobora com os estudos que apontam marcas como ícones culturais (HOLT, 2004). Assim, as marcas fazem parte da cultura popular e, apesar de terem seus próprios significados, esses são muitas vezes modificados pelos consumidores.

Referências

BLACKMORE, S. The meme machine. Oxford, UK: Oxford Paperbacks, 2000.

BLIKSTEIN, I. Técnicas de comunicação escrita. São Paulo: Contexto, 2016.

DECLERCQ, M. Como o LDRV se tornou a espinha dorsal do Brasil memético, 2017. Available from:  https://www.vice.com/pt_br/article/kz3dz9/como-o-ldrv-se-tornou-a-espinha-dorsal-do-brasilmemetico

GODWIN, M. Meme, counter meme. Wired, 1994. Avaliable from:  https://www.wired.com/1994/10/godwin-if-2/

HOLT, D. B. How brands become icons: the principles of cultural branding. Boston, USA: Harvard Business School Press, 2004.

Para ler o artigo, acesse

ZANETTE, M. C., BLIKSTEIN, I. and Visconti, L. M. Viralidade intertextual e repertórios vernaculares: memes da internet como objetos conectando diferentes mundos on-line. Rev. adm. empres., v. 59, n. 3 p. 157-169, 2019. ISSN: 0034-7590 [viewed 20 November 2019]. DOI: 10.1590/s0034-759020190302. Available from: http://ref.scielo.org/5ygqwt

Link externo

Revista de Administração de Empresas – RAE: www.scielo.br/rae

 

Como citar este post [ISO 690/2010]:

ZANETTE, M. C. Como os memes da internet conectam diferentes mundos? [online]. SciELO em Perspectiva: Humanas, 2019 [viewed ]. Available from: https://humanas.blog.scielo.org/blog/2019/11/26/como-os-memes-da-internet-conectam-diferentes-mundos/

 

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