Como é ser caminhoneiro no Brasil? Relações entre autoimagem e trabalho precário

João Carlos Messias, Professor e pesquisador do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Psicologia, Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas), Campinas, SP, Brasil.

Hector Cavieres Higuera, Pesquisador da Escuela de investigación y postgrado facultad de Ciencias Sociales Jurídicas y Económicas, Universidad Católica Silva Henríquez, Santiago, Chile.

Imagem: Creative Company em Unsplash

O artigo “Ser caminhoneiro no Brasil: dos autoestereótipos implícitos à justificação de sistema”, publicado em Estudos de Psicologia (Campinas, vol. 36), aborda a percepção que os caminhoneiros brasileiros têm a respeito de si mesmos e das condições de trabalho às quais são sujeitos, caracterizadas por extrema precariedade. Este estudo é oriundo da tese de doutorado “A realidade dos caminhoneiros brasileiros de acordo com a teoria de justificação de sistema” de Ramon Araújo Silva (2020) que empregou metodologia qualitativa, entrevistas e acompanhamento das atividades de um grupo de oito profissionais em situação natural, dado o caráter etnográfico da mesma. Vale lembrar que a entrevistas aconteceram poucos meses depois da greve dos caminhoneiros que paralisou o Brasil em 2018 por 11 dias e que, ainda assim, não acarretou melhorias para eles.

A principal modalidade logística utilizada no Brasil é o transporte rodoviário de cargas, atividade que envolve, atualmente, cerca de dois milhões de caminhoneiros, em sua maioria autônomos. Os trabalhadores que participaram da pesquisa em questão são experientes na profissão, cumprem regularmente longas viagens e precisam manter-se ao volante por muitas horas seguidas, não raro 18 a 20 horas. O uso de anfetaminas é comum e compreendido, por muitos, como uma espécie de equipamento de segurança, a fim de evitar sonolência e acidentes. As relações contratuais são precárias, sendo que os riscos e manutenção dos caminhões ficam por conta dos próprios caminhoneiros.

Os depoimentos foram analisados de acordo com a investigação social de discurso (COTTET, 2006). Cinco categorias principais foram encontradas, com destaque para a autoimagem positiva (“herói do asfalto”) e negativa (“cachorro vira-latas / bandido”) e analisadas a partir da Teoria de Justificação de Sistema, modelo teórico oriundo da Psicologia Social que permite compreender importantes elementos relacionados à condição de grupos em situação de desvantagem. De acordo com essa teoria, auto estereótipos implícitos exercem influência na manutenção da situação de precariedade de tais grupos, fato que se observou na vivência laboral dos entrevistados. Por fim, ressalta-se que não se trata de culpabilizar uma categoria profissional que trabalha em condições limite, mas compreender quais bloqueios psicológicos os impedem de conseguir melhores e mais dignas condições para exercer seu ofício.

No vídeo a seguir, João Carlos Messias (orientador da tese) e Hector Cavieres Higuera ampliam a discussão do assunto.

Referências

COTTET, P. Diseños y estrategias de investigación social: el caso de la ISCUAL. In: CANALES, M. (ed.), Metodologías de la investigación social: introducción a los oficios (pp. 185-217). Santiago: LOM, 2016.

SILVA, R.A. A realidade dos caminhoneiros brasileiros de acordo com a teoria de justificação de sistema. Tese (Doutorado em Psicologia) – Pontifícia Universidade Católica de Campinas, PUC-Campinas, 2020.

Para ler o artigo, acesse

MESSIAS, J. C. et al. Being a truck driver in Brazil: From implicit self-stereotypes to system justification. Estud. psicol. (Campinas) [online]. 2019, vol. 36, e180139, ISSN 0103-166X [viewed 27 April 2020]. DOI: 10.1590/1982-0275201936e180139. Available from: http://ref.scielo.org/fwbsxr

Links externos

Estudos de Psicologia (Campinas) – ESTPSI: www.scielo.br/estpsi

http://dgp.cnpq.br/dgp/espelhogrupo/7642160025550061

http://investigacion.ucsh.cl/investigador/hector-cavieres/

Sobre os autores

João Carlos Messias, docente e pesquisador da PUC-Campinas, líder do grupo Psicologia e Trabalho: Abordagem experiencial. Atua na área de Psicologia da Saúde Ocupacional com enfoque em fenomenologia.
E-mail: joao.messias@puc-campinas.edu.br
Lattes: (http://lattes.cnpq.br/7861317602243394)
Facebook: João Carlos Messias
Twitter: @joaocmessias
Instagram: profjoaomessias

 

Hector Cavieres Higuera, pesquisador, membro do corpo docente do doutorado em ciências sociais e juventude e diretor de pesquisa e pós-graduação da Universidade Católica Silva Henríquez. Assistente acadêmico na área de Psicologia Social da Universidad del Desarrollo.
E-mail: Hcavieres@ucsh.cl
Facebook: Héctor Cavieres
Twitter: @hcavieres

 

 

Como citar este post [ISO 690/2010]:

MESSIAS, J. C. and HIGUERA, H. C. Como é ser caminhoneiro no Brasil? Relações entre autoimagem e trabalho precário [online]. SciELO em Perspectiva: Humanas, 2020 [viewed ]. Available from: https://humanas.blog.scielo.org/blog/2020/05/04/como-e-ser-caminhoneiro-no-brasil-relacoes-entre-autoimagem-e-trabalho-precario/

 

Leave a Reply

Your email address will not be published. Required fields are marked *

Post Navigation