A experiência do autor na prática da Ciência Aberta na Bakhtiniana

Carlos Gontijo Rosa, Revisor responsável da Revista Bakhtiniana, Professor da Universidade Federal do Acre, Cruzeiro do Sul, AC, Brasil.

Logo do periódico BakhtinianaPara a entrevista com autor, contamos com a participação do Prof. Dr. José Deribaldo Gomes dos Santos, professor da Universidade Estadual do Ceará, Bolsista de Produtividade em Pesquisa do CNPq – Nível 2 e autor do texto “Jackson do Pandeiro: anotações sobre o cotidiano na obra do Rei do Ritmo”, publicado na Revista Bakhtiniana, vol. 18, no. 1, de 2023.

[CARLOS GONTIJO ROSA] Os resultados de pesquisa apresentados em seu artigo são oriundos de um projeto único ou é parte de uma pesquisa maior?

[JOSÉ DERIBALDO GOMES DOS SANTOS] Fazem parte de uma pesquisa. Melhor, de um sonho de menino. Sonhava em escrever um livro sobre Jackson do Pandeiro. Mas, apenas depois de muitos anos realizando pesquisas na área da estética marxista, consegui reunir elementos que me possibilitaram escrever sobre este artista monumento. Foi com o conhecimento sobre a Estética de Lukács que angariei as condições necessárias para iniciar a empreitada. O artigo, em verdade, foi um teste para saber se eu estava no caminho certo; ou se a trajetória poderia ser perseguida.

[CGR] Alguns estudantes iniciantes na vida acadêmica às vezes se sentem perdidos quanto à escrita e apresentação dos seus resultados de pesquisa. Para este artigo, qual foi o seu processo de trabalho e escrita?

[JDGS] Em outra oportunidade já me fizeram uma pergunta parecida com esta. O que tenho a dizer sobre meu processo particular de produzir exposições científicas tem muito a ver com disciplina, repetibilidade, rigor, ritmo; ou seja, acostumar o corpo em seus aspetos físicos-corpóreos e psicológicos ao exercício da escrita. Não se pode esquecer, como ensina Marx, que a pesquisa é distinta da exposição. A escrita é uma consequência da investigação. Se esta não for bem realizada, a redação, mesmo caprichada, apresentará muitos problemas de conteúdo.

Sobre isso, ainda quero levantar uma questão. Em relação à literatura, não consigo compor com o mesmo rigor. Nem aproximado! A literatura, diferentemente da ciência, domina minha vontade. A produção científica, necessariamente, precisa ter caráter independente de minha vontade. Isso não quer dizer que eu possa produzir cientificamente sem vontade. Nada disso! Mas o resultado científico depende da realidade e não de meu gosto. A literatura sim, depende completamente dessa vontade. Mas não só dela; é preciso um conjunto de fatores, a maioria antropomórfico, para que a literatura jorre por minhas mãos.

[CGR] O que o levou a submeter à Revista Bakhtiniana?

[JDGS] Como comentei acima, estava escrevendo meu primeiro livro de crítico. Mesmo sendo um livro sobre crítica artístico-musical, quero aproveitar a oportunidade e dizer o seguinte: o livro não pode ter a pretensão máxima de afiançar a obra de Jackson do Pandeiro. Sobretudo porque o autor do livro declara, logo nas páginas iniciais, que não pretende se desviar do juízo de gosto, pois é completamente apaixonado, e não quer negar, pela obra do artista paraibano.

Ainda assim, insisti na possibilidade de concluir o livro. A Revista Bakhtiniana, por seu respeito científico e potência em abrigar reflexões como a que traz no livro, foi escolhida para que eu tivesse alguma iluminação sobre o que estava escrevendo. Isso, posso depor com segurança, trouxe os resultados que esperava. Primeiro pelo debate com os pareceres e depois com a própria publicação.

Foto em preto e branco de Jackson do Pandeiro.

Imagem: Wikipedia.

[CGR] Um dos nossos grandes orgulhos, como editores da Bakhtiniana, é o sucesso com que a Ciência Aberta vem sendo implementada na revista. Você, como autor experimentado, como percebe a diferença entre o sistema duplo cego e a C.A.?

[JDGS] Penso que, de modo geral e com algumas nomeáveis exceções, a maioria das publicações dos periódicos nacionais e internacionais tem como objetivo a pontuação para o Currículo Lattes. É de se lastimar que se perca tanto tempo apenas para adornar ociosamente os currículos. A sociedade perde muito com essa prática. O que se convencionou chamar de Ciência Aberta traz a possibilidade de um diálogo mais direto e com retorno sobre a produção acadêmica. Espero que esse modelo possa dinamizar o que se produz nos corredores universitários, potencializando a discussão em torno de problemas reais do mundo. Quero dar um exemplo para concluir essa questão: é de se estranhar que expressões como capitalismo e luta de classes tenham desaparecido do léxico da maioria dos periódicos. Por que será que isso acontece? Espero que a Ciência Aberta traga alguma possibilidade de reflexão sobre isso!

[CGR] O seu artigo inicialmente recebeu pareceres restritivos quanto à publicação, e só após uma segunda rodada foi plenamente aprovado para publicação. Para você, como autor, como foi o processo de revisão do texto?

[JDGS] Tenho a declarar que as restrições são acompanhadas pelas formações e opções epistemológicas de quem elaborou o parecer. No meu caso, como precisava saber como Jackson do Pandeiro era recebido no meio acadêmico, escolhi uma revista de prestígio para perscrutar o retorno. Sobre as solicitações que os pareceres trouxeram, considerei pertinentes. Contudo, não era possível o atendimento irrestrito. Por isso, atendi ao que o objeto permitia que se atendesse. Era importante não desfigurar o objeto. As sugestões de quem avaliou não solicitavam uma reviravolta no objeto; senão alguns elementos, decerto que bem relevantes, que deixavam a exposição com uma condição mais adequada a publicação.

[CGR] Acreditamos que a Ciência Aberta expõe um pouco da humanidade existente no trabalho científico. Enquanto autor e enquanto acadêmico de carreira, como foi receber um parecer que trazia críticas ao seu trabalho?

[JDGS] A ciência não vive sem críticas. Quem precisa diluir as críticas é a moda do coach. Moda que lamentavelmente chega com muita força ao espaço académico. Como Marx alertou, entender a sociedade é ir à raiz de seus problemas, e apenas é possível penetrar na raiz com a crítica constante.

Para ser sincero, o que mais me incomoda é quando submeto um determinado artigo, produto de uma pesquisa, e não recebo crítica alguma. Aí sim, sinto-me incomodado. Quando as críticas chegam, entre os caminhos que se apresentam, dois são os mais instantâneos: rejeitá-las ou absorvê-las com vistas a uma melhor compreensão da realidade. Tenho a dizer, para concluir, que a crítica não deveria inundar o desespero. Ao contrário, a crítica, a radicalidade no entendimento dos problemas sociais, ou seja, a crítica que vai à raiz dos problemas, esta sim deveria ser cultuada e incentivada em tempos tão obscuros.

Para ler o artigo, acesse

SANTOS, J.D.G. Jackson do Pandeiro: anotações sobre o cotidiano na obra do Rei do Ritmo. Bakhtiniana, Rev. Estud. Discurso [online]. 2023, vol. 18, no. 1, pp. 58-86 [viewed 11 May 2023]. https://doi.org/10.1590/2176-4573p57884. Available from: https://www.scielo.br/j/bak/a/tDRHpwgSzS754DzSGQtBchL/

Links externos

Bakhtiniana. Revista de Estudos do Discurso – BAK: https://www.scielo.br/j/bak/

 

Como citar este post [ISO 690/2010]:

ROSA, C.G. A experiência do autor na prática da Ciência Aberta na Bakhtiniana [online]. SciELO em Perspectiva: Humanas, 2023 [viewed ]. Available from: https://humanas.blog.scielo.org/blog/2023/05/11/a-experiencia-do-autor-na-pratica-da-ciencia-aberta-na-bakhtiniana/

 

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