O ensino público feminino no Maranhão antecedeu ao marco brasileiro de escolarização de meninas, em 1827

Mariléia dos Santos Cruz – Professora de História da Educação Brasileira; Universidade Federal do Maranhão, Imperatriz, Maranhão, Brasil. 

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O artigo Instrução pública do “sexo feminino” no Maranhão: no Diretório dos Índios e início do século XIX analisa aspectos da escolarização feminina na história maranhense, a partir dos possíveis efeitos da publicação do Diretório dos Índios, e aponta registros sobre as primeiras professoras nomeadas no estado, no início do século XIX. 

A pesquisa, realizada pela professora Mariléia dos Santos Cruz, da Universidade Federal do Maranhão, investigou rica documentação composta por publicações da imprensa do Maranhão (1822-1838), ofícios de professores, documentos paroquiais, legislações brasileira e portuguesa e pelo Diretório dos Índios de 1757, que estabelecia aulas públicas separadas por gêneros e tornava legal a presença de meninas em aulas masculinas diante da impossibilidade de constituir turmas femininas por falta de docentes habilitadas.

Capa do Diretório dos índios de 1757

Imagem: Senado.

Figura 1. Capa do Diretório dos índios de 1757

O estudo identificou a presença de professoras de primeiras letras no Maranhão no serviço público entre 1823 e 1833, como consequência do Edital de criação das escolas públicas, que, com respaldo do Diretório, autorizava a realização de concurso para provimento de professores para os dois gêneros. Essa informação contrasta com a historiografia sobre escolarização feminina, que coloca como marco da entrada das mulheres no ensino público a Lei Geral das Escolas de Primeiras Letras de 15 de outubro de 1827 (Carra, 2019; Chamon, 2006; Hahner, 2011; Munhoz, 2022). 

Esse mesmo edital possibilitava a matrícula de meninas em escolas masculinas no interior mesmo que não houvesse professora do sexo feminino, o que pode indicar que a origem da escolarização em aulas mistas na América Portuguesa esteja mais atrelada à carência de escolas específicas para as mulheres do que ao princípio moderno da coeducação, defendido no Brasil a partir do final do século XIX.  

Artigos 7 e 8 do Diretório dos Índios mandando criar aulas para os dois gêneros, com a possibilidade de as mulheres estudarem em escolas masculinas

Imagem: Senado.

Figura 2. Artigos 7 e 8 do Diretório dos Índios mandando criar aulas para os dois gêneros, com a possibilidade de as mulheres estudarem em escolas masculinas

Os resultados do estudo indicam necessidade de maior atenção à documentação do período colonial, sobretudo em relação aos impactos da publicação do Diretório dos Índios de 1757, sobre a escolarização pública feminina no Brasil, que antecedeu iniciativas de mesmo teor em Portugal, já que escolas públicas para mulheres fora do espaço religioso só foram criadas na Corte em 1790, com tardia autorização para o preenchimento das vagas em 1815. 

A pesquisadora acredita que o estudo recuado do período em que a maioria das pesquisas sobre a escolarização pública feminina se concentra pode ser muito frutífero para a compreensão do processo de feminização do magistério.

Referências

CARRA, P.R.A. Escola mista? Coeducação? Um desafio histórico para a educação de meninos e meninas. Cadernos de História da Educação [online]. 2019, vol. 18, no. 2, pp. 548-570 [viewed 23 October 2023]. https://doi.org/10.14393/che-v18n2-2019-15. Available from: https://seer.ufu.br/index.php/che/article/view/50310 

CHAMON, M. Trajetória de feminização do magistério e a (con)formação das identidades profissionais [online]. VI Seminário da REDESTRADO – Regulação Educacional e Trabalho Docente. 2006 [viewed 23 October 2023]. Available from: http://www.fae.ufmg.br/estrado/cd_viseminario/trabalhos/eixo_tematico_1/trajetoria_de_feminizacao.pdf 

Diretório que se deve observar nas povoações dos índios do Pará, e Maranhão: Enquanto sua magestade não mandar o contrário [online]. Senado Federal. 1758 [viewed 23 October 2023].Available from: https://www2.senado.leg.br/bdsf/item/id/518740 

Edital para provimento e Creação de Eschollas, de 15 de julho de 1822 [online].Coleção Digital de Jornais e Revistas da Biblioteca Nacional. 1822 [viewed 23 October 2023]. Available from: https://memoria.bn.br/DocReader/docreader.aspx?bib=749524&pasta=ano%20182&pesq=edital”&pagfis=501

HAHNER, J.E. Escolas mistas, escolas normais: A coeducação e a feminização do magistério no século XIX. Revista Estudos Feministas [online]. 2011, vol. 19, no. 2, pp. 467-473 [viewed 23 October 2023]. https://doi.org/10.1590/S0104-026X2011000200010. Available from: https://periodicos.ufsc.br/index.php/ref/article/view/s0104-026×2011000200010  

MUNHOZ, F.G. Docência, gênero e raça. In: ECAR, A.L. and BARROS, S.A.P. (Orgs.). História da educação, formação docente e a relação teoria-prática. Portal de Livros Abertos da USP [online]. 2022 [viewed 23 October 2023]. https://doi.org/10.11606/9786587047287. Available from:  http://www.livrosabertos.sibi.usp.br/portaldelivrosUSP/catalog/book/757 

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CRUZ, M.S. O ensino público feminino no Maranhão antecedeu ao marco brasileiro de escolarização de meninas, em 1827 [online]. SciELO em Perspectiva: Humanas, 2023 [viewed ]. Available from: https://humanas.blog.scielo.org/blog/2023/10/23/o-ensino-publico-feminino-no-maranhao/

 

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