Por Júlio César Lopardo Alves e Tarsila Baptista Ponce, Membros da equipe editorial da Revista Brasileira de Saúde Ocupacional, São Paulo, SP, Brasil
O trabalho infantil é ilegal. Ao mesmo tempo em que deve contribuir para a erradicação do trabalho de crianças e adolescentes, o Sistema Único de Saúde (SUS) precisa garantir atenção integral à saúde dos trabalhadores, sem distinção. Como conciliar as duas tarefas? Como oferecer atenção integral a jovens que, por diversas razões, podem ter suas atividades laborais e agravos à saúde ignorados? O relato de experiência “Reflexões sobre a relação trabalho-saúde de crianças e adolescentes: um espaço de intervenção na formação em Saúde do Trabalhador”, publicado pela Revista Brasileira de Saúde Ocupacional (vol. 45), apresenta os resultados de uma oficina oferecida para multiplicadores de Vigilância em Saúde do Trabalhador (Visat). A partir das opiniões e das experiências práticas dos participantes, o estudo discute os limites e as possibilidades do campo da Saúde do Trabalhador (ST) no combate à exploração do trabalho infantil. De acordo com os autores, a ST ajuda a esclarecer aspectos desconsiderados da relação trabalho/saúde de crianças e adolescentes, isso porque analisa as dimensões técnicas e sociais do trabalho (MINAYO-GOMEZ; THEDIM-COSTA, 1997), possibilitando uma atuação mais efetiva e integral. O estudo aponta que é importante realizar intervenções sobre a relação infância/trabalho/saúde em espaços de formação de profissionais de vigilância, educação e atenção à saúde. Os autores destacam que não se trata de retroceder no combate à exploração do trabalho de crianças e adolescentes. A questão é garantir atenção integral aos jovens que trabalham, pelo menos até que o trabalho infantil seja totalmente erradicado.
Os participantes da oficina eram agentes públicos capacitados para ministrar cursos básicos de Visat. Atuam na implementação da Política Nacional de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora. A oficina foi dividida em cinco eixos: 1) Exposição da definição e de dados sobre o trabalho infantil no Brasil e no mundo; 2) Apresentação do histórico da proibição e dos principais documentos oficiais sobre o tema; 3) Apresentação de questões norteadoras (Por que o trabalho é proibido às crianças? Por que é tão difícil erradicar o trabalho infantil? Quando falamos “trabalho infantil” que “imagem” vem ao seu pensamento? Já teve alguma experiência com algum caso de trabalho infantil? Em sua análise crítica, quais são os problemas existentes? E como a sociedade e o poder público devem encarar o tema?); 4) Levantamento de dúvidas e experiências; 5) Reflexão sobre limites e possibilidades de intervenções.
Em 2014, o Brasil contabilizou 3,3 milhões de crianças entre 5 e 17 anos em situação de trabalho. Em 2016, nessa mesma faixa etária, havia 2,6 milhões de crianças em situação de trabalho. Apesar da redução do total geral, cresceu o número de crianças entre 5 e 9 anos em situação de trabalho (OBSERVATÓRIO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE). Diante desses números, os autores refletiram sobre a falta de efetividade das políticas públicas para a erradicação do trabalho infantil e o atendimento às demandas de saúde destes trabalhadores.
Nesse contexto, cabe destacar o campo da Saúde do Trabalhador (ST) como parte do Sistema Único de Saúde (SUS). A ST analisa a gênese e a dinâmica da relação saúde-doença a partir dos processos de trabalho observados na sociedade (MENDES; DIAS, 1991). Atualmente, o grande desafio é, a partir da ação dos sujeitos envolvidos, construir intervenções capazes de transformar as situações de trabalho, eliminando agravos e promovendo a saúde (JACKSON FILHO et al., 2018). As interfaces do trabalho de crianças e adolescentes, os limites e as possibilidades que se apresentam, fazem parte desse processo.
Referências
MINAYO-GOMEZ, C. and THEDIM-COSTA, S.M.F. A construção do campo da saúde do trabalhador: percurso e dilemas. Cad. Saúde Pública [online]. 1997, vol. 13, suppl. 2, pp. S21-S32. ISSN: 0102-311X [viewed 8 May 2020]. DOI: 10.1590/S0102-311X1997000600003. Available from: http://ref.scielo.org/tc4g5s
OBSERVATÓRIO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE População entre 5 e 17 anos ocupada [viewed 8 May 2020]. Available from: https://observatoriocrianca.org.br/cenario-infancia/temas/trabalho-infantil/621-populacao-entre-5-e17-anos-ocupada?filters=1,236
MENDES, R. and DIAS, E.C. Da medicina do trabalho à saúde do trabalhador. Rev. Saúde Pública [online]. 1991, vol. 25, no. 5, pp. 341-349, ISSN: 0034-8910 [viewed 8 May 2020]. DOI: 10.1590/S0034-89101991000500003. Available from: http://ref.scielo.org/mhdncr
JACKSON FILHO, J.M., et al. Desafios para a intervenção em saúde do trabalhador. Rev. bras. saúde ocup. [online]. 2018, vol. 43, suppl. 1 e13s. ISSN: 0303-7657 [viewed 8 May 2020]. DOI: 10.1590/2317-6369ap0141218. Available from: http://ref.scielo.org/cwn8qw
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AGUIAR JUNIOR, V.S. and VASCONCELLOS, L.C.F. Reflexões sobre a relação trabalho-saúde de crianças e adolescentes: um espaço de intervenção na formação em Saúde do Trabalhador. Rev. bras. saúde ocup. [online]. 2020, vol. 45, e5. ISSN: 0303-7657 [viewed 8 May 2020]. DOI: 10.1590/2317-6369000035018. Available from: http://ref.scielo.org/y5yjx3
Link externo
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