Por Ana Maria Setubal Pires Vanin, Departamento de Oceanografia Biológica do Instituto Oceanográfico da USP, SP, Brasil
O artigo intitulado “Effects of structural factors on upwelling fouling community” publicado no volume 64, número 4, do Brazilian Journal of Oceanography apresenta alterações nas características hidrológicas, associadas à profundidade e luz, em um ambiente de ressurgência sazonal, permitiu a formação de múltiplos estados estáveis no sistema de comunidade incrustantes. Além disso, foram observadas interações, visando alimentação e abrigo, entre peixes carnívoros, invertívoros e omnívoros e a comunidade, o que destaca a importância da predação no processo de sucessão do biofouling.
Multi-experimentos foram empregados por pesquisadores da Universidade Estadual do Rio de Janeiro, Universidade Norte Fluminense e do Instituto de Estudos do Mar Almirante Paulo Moreira em trabalho conjunto para investigar os fatores estruturadores de comunidades incrustantes no ecossistema de ressurgência de Cabo Frio, costa sudeste brasileira. Em painéis experimentais foram monitoradas as trajetórias sucessionais dessas comunidades e, simultaneamente, foi investigado os efeitos da temperatura associados à profundidade, orientação do substrato e predação por peixes.
A região de Cabo Frio está sujeita à ressurgência sazonal de água fria que traz para a área temperaturas inferiores a 18°C. Nesses eventos a estratificação da coluna de água ocorre com a intrusão de águas frias vinda do Sul, ricas em nutrientes, que atinge a orla marinha. A intensidade dessa intrusão varia ao longo do ano, mas geralmente atinge a intensidade máxima durante a primavera e verão do hemisfério Sul. Outono e inverno são períodos com baixa frequência de eventos de ressurgência, sendo época em que ocorre forte mistura e homogeneização da coluna de água.
Segundo alguns autores, a intensidade e frequência de eventos de ressurgência pode afetar a variabilidade ambiental e pode também influenciar o nível de estresse que as comunidades incrustantes experimentam, proporcionando assim a ocorrência de trajetórias sucessionais divergentes.
Mudanças oceanográficas com consequências ecologicamente significativas, tal como variação na oferta de alimentos, podem ocorrer em regimes de afloramentos sazonais. O fornecimento de nutrientes para o plâncton, micro e macroalgas bentônicas, e consequentemente para os organismos filtradores, exerce uma influência marcante sobre o controle de sistemas tróficos e, portanto, sobre a estrutura e dinâmica das comunidades marinhas bentônicas. Na região de Cabo Frio, estudos têm sugerido que o aumento da concentração de nutrientes durante os eventos de ressurgência pode sustentar uma biomassa de algas consideravelmente superior àquela existente na área em períodos sem ressurgência.
A novidade deste estudo reside na abordagem multi-experimental que maximiza a quantidade de informações gerais sobre os principais fatores estruturantes da comunidade, permitindo a avaliação da influência de um único fator e daqueles a serem considerados em desenhos multi-experimentais futuros. “Além disso, experimentos realizados com abordagem múltipla, em ecossistemas de ressurgência, também ajudam a elucidar as conexões entre os processos bento-pelágicos, afirmam os autores”.
Cinco unidades multi-experimentais foram afixadas ao substrato, cada uma sustentando três painéis de PVC (20 × 15 cm) em profundidades de 1,5 e 3,5 m. O efeito da predação dos peixes foi testado a uma profundidade de 3,5 m e incluiu um painel aberto, de livre acesso para os peixes; um painel completamente fechado, para excluir os peixes, e um painel parcialmente fechado. Os painéis experimentais foram estudados durante 12 meses.
Os resultados apontam que as maiores diferenças de temperatura entre as profundidades ocorreram no período primavera-verão austral. Essa estratificação da coluna de água indica a alta frequência de eventos de ressurgência durante o período. A dissimilaridade entre as associações situadas em 1,5 e 3,5 m de profundidade aumentou ao longo da sucessão, mostrando que as trajetórias sucessionais não são similares nas diferentes profundidades. O efeito da orientação do substrato sobre a comunidade incrustante foi também significativo. A dissimilaridade entre as comunidades da face superficial do painel (mais iluminada) e da face voltada para baixo (mais sombreada) aumentou ao longo da trajetória sucessional e refletiu a composição biota. Ocorreu um claro domínio de invertebrados sésseis, especialmente do briozoário Schyzoporella errata, nos ambientes mais sombreados, e a dominância de espécies fotófilas, principalmente Jania sp., nas faces dos painéis voltadas para cima.
A comunidade incrustante incluiu ainda sete grupos taxonômicos de invertebrados e seis grupos funcionais de algas. Qualitativamente, 12 espécies de peixes e cinco categorias tróficas foram registradas, havendo o domínio dos onívoros. Os resultados sugerem que a alta intensidade de predação e seus efeitos sobre a composição da biota bêntica estejam relacionados ao hábito trófico dos predadores.
Os autores concluem o artigo considerando que cada fator físico pode alterar a trajetória de sucessão e, consequentemente, a composição da comunidade. Portanto, a fase final da comunidade incrustante não é predeterminada, mas sim norteada por fatores intrínsecos e extrínsecos, que atuarão como vetores principais de mudanças no modelo de sucessão.
Para ler o artigo, acesse:
MASI, B.P., ZALMON, I. and COUTINHO, R. Effects of structural factors on upwelling fouling community, Southeast Brazil. Braz. j. oceanogr. [online]. 2016, vol. 64, n. 4, pp. 387-400 [viewed 06 January 2017]. DOI: 10.1590/s1679-87592016128706404. Available from: http://ref.scielo.org/tst83c
Link externo
Brazilian Journal of Oceanography – BJOCE: <http://www.scielo.br/bjoce>
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