Por Maria Cecília de Souza Minayo, Editora-chefe e Luiza Gualhano, Assistente de comunicação, Rio de Janeiro, RJ, Brasil
Ciência & Saúde Coletiva, na edição de número 4, apresenta artigos que resultam de análises efetuadas em ambientes de cooperação entre pesquisadores nacionais e internacionais, suas instituições e organismos governamentais sobre o tema da regionalização do SUS. As desigualdades sociais e as assimetrias locais e regionais são tratadas como pano de fundo ou objetivo direto da maior parte dos estudos que abordam principalmente: lacunas no sistema federativo; mecanismos de governança, participação social e capacidade de governo; financiamento setorial e desigualdades sociais; assimetrias regionais no acesso a redes, serviços e medicamentos; e diferentes dinâmicas e percepções de atores políticos.
A edição reúne uma riqueza imensa de conhecimento sobre a implementação do SUS — um sistema em permanente processo de crítica, mudanças e que precisa de aprimoramento. Seria muito difícil mostrar aqui as conclusões sobre sua federalização, pois são muitos os pensadores e suas perspectivas de pesquisa e análise. Mas sem dúvida, é possível dizer com Ribeiro, et al. (2017, p. 1041) que “embora existam muitos exemplos bem-sucedidos, a dinâmica entre cooperação e competição dentro do sistema é uma das principais falhas do SUS. O federalismo cooperativo é um processo contraditório e sem rumos pré-definidos. E não existem evidências de que a cooperação tenha se tornado um padrão dominante no Brasil. […] [Assim], as experiências exitosas de consórcios, distritos sanitários e colegiados regionais dizem mais sobre potenciais do modelo do que sobre um padrão sustentado e disseminado”.
Dado o tamanho do país, as diferenças e as desigualdades entre e intra Estados e Municípios, um dos pontos mais cruciais para o Sistema Único de Saúde (SUS) é o processo de regionalização que hipoteticamente traria a gestão e a oferta de serviços para a proximidade dos indivíduos e de suas necessidades. No entanto, para o êxito dessa tarefa, hoje seria preciso um novo fervor político como o vivido nos tempos iniciais da chamada Reforma Sanitária Brasileira, para que a atuação dos construtores do SUS fosse apoiada por um provimento financeiro sério e responsável (REIS, et al., 2017). É de conhecimento de todos os estudiosos do tema que, se existem problemas de gestão – a eterna desculpa para o desinvestimento no SUS – é indubitável também que os recursos financeiros alocados são poucos e insuficientes. Para se ter uma ideia desse estado de coisas, comparando-se o gasto médio com o percentual do PIB entre os países que integram a OMS que é de 5,5%, o do Brasil é de apenas a 3,7%. Também está abaixo do que é destinado no Uruguai, na Argentina, no Chile e em Costa Rica e é cerca de 15 vezes menor que o do Canadá, dos países Europeus e da Austrália. Para o Brasil se equiparar aos países com sistemas universais, a despesa pública em saúde deveria subir para 8,3% do PIB, segundo a OMS (CARVALHO, 2013).
Neste momento, no meio de toda a crise brasileira que atinge todas as políticas públicas, apareceu um novo e poderoso obstáculo. Pela primeira vez se observa que o sistema político-partidário e o Poder Executivo Estadual são os grandes ausentes nas coalizões de apoio às políticas de regionalização. Esse é um dado novo, pois desde sua criação, o SUS sempre foi de extremo interesse para as coalizões políticas, recebendo apoio suprapartidário e de lideranças sociais, muitas vezes manifestando-se na pressão por ocupação de cargos executivos municipais e estaduais que garantiam apoio em momentos críticos. É o que mostra o artigo de Moreira, Ribeiro e Ouverney (2017).
Em resumo, esta edição constitui uma crítica por dentro do SUS sobre como está sendo a sua capilarização pelo país. Essa crítica parte de pessoas que buscam conhecer os problemas para apontar rumos e soluções. Elas são unânimes em valorizar o sistema que atende a maior parte dos brasileiros. Pois, consideram-no um bem da sociedade, que não pode ser sucateado e menosprezado, e sim, tratado como instrumento eficaz de construção da igualdade social e em saúde.
Referências
CARVALHO, G. A saúde pública no Brasil. Estud. Av. [online]. 2013, vol. 27, no. 78, pp. 7-26, ISSN 0103-4014 [viewed 24 April 2017]. DOI: 10.1590/S0103-40142013000200002. Available from: http://ref.scielo.org/m66kfp
MOREIRA, M. R., RIBEIRO, J. M. and OUVERNEY, A. M. Obstáculos políticos à regionalização do SUS: percepções dos secretários municipais de Saúde com assento nas Comissões Intergestores Bipartites. Cienc. Saude Colet. [online]. 2017, vol. 22, no. 4, p. 1097-1108, ISSN 1413-8123 [viewed 24 April 2017]. DOI: 10.1590/1413-81232017224.03742017. Available from: http://ref.scielo.org/syjgh8
REIS, A. A. C., et al. Reflexões para a construção de uma regionalização viva. Ciênc. saúde coletiva [online]. 2017, vol. 22, no. 4, pp. 1045-1054, ISSN 1413-8123 [viewed 24 April 2017]. DOI: 10.1590/1413-81232017224.26552016. Available from: http://ref.scielo.org/d6zbkv
RIBEIRO, J. M., et al. Políticas de saúde e lacunas federativas no Brasil: uma análise da capacidade regional de provisão de serviços. Ciênc. saúde coletiva [online]. 2017, vol. 22, no. 4, pp. 1031-1044, ISSN 1413-8123 [viewed 24 April 2017]. DOI: 10.1590/1413-81232017224.03732017. Available from: http://ref.scielo.org/hxxbfm
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