Cada vez mais a Saúde Individual e a Saúde Coletiva dependem de nosso Modo de Vida

Maria Cecília de Souza Minayo, Editora-chefe do periódico Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.

Luiza Gualhano, Editora assistente do periódico Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.

Logo do periódico Ciência & Saúde ColetivaDentre as mudanças positivas ocorridas no século XX, está o controle ou eliminação de grande parte das doenças infeciosas e transmissíveis, fruto dos avanços da medicina, da saúde pública e das transformações sociais. Ao contrário, vem aumentando a incidência de doenças crônicas, o que afeta toda a população, especialmente a mais longeva (Francisco, et al., 2022).

Esse fenômeno passou a ser um problema global e nacional pela expressiva magnitude dos indicadores de morbimortalidade. É o que o artigo Análise temporal das prevalências de doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) e dos fatores de risco e proteção publicado pela Ciência e Saúde Coletiva (vol. 30, 2025) e escrito por Malta, et al. (2025) ,que traz com dados, a questão em pauta e recobre o intervalo de 2006 a 2023.

O ponto mais relevante desse estudo é a demonstração de que as enfermidades crônicas são umbilicalmente ligadas a hábitos, atitudes e práticas cotidianas, indicando que o próprio cidadão divide, com o setor saúde, a responsabilidade por sua vida saudável, pela prevenção de agravos e até por sua longevidade (Francisco et al., 2022).

Para realizar este estudo, os autores usaram um dispositivo do Ministério da Saúde denominado VIGITEL, instrumento de vigilância de fatores de risco para DCNT que, por telefone, averigua na população: uso de tabaco; consumo abusivo de bebida alcóolica; consumo de frutas e hortaliças; consumo regular de feijão; consumo de alimentos protetores; consumo de alimentos ultraprocessados; prática suficiente ou insuficiente de atividade física; excesso de peso; obesidade; hipertensão e diabetes.

Os quatro principais grupos de enfermidades não transmissíveis são as doenças cardiovasculares, o câncer, as doenças respiratórias crônicas e a diabetes. Elas compartilham fatores de riscos, comportamentais comuns e modificáveis, como o tabagismo, consumo abusivo de bebidas alcoólicas, inatividade física e alimentação inadequada (WHO, 2013; 2023). Infelizmente, como em todos os âmbitos nacionais, os fatores de risco se distribuem de forma distinta, afetando mais os grupos vulneráveis, de baixa renda e escolaridade. Porém, todos os segmentos sociais estão suscetíveis aos riscos.

 

 

No seu artigo, os autores escolheram a escolaridade como um indicador potente para medir desigualdades na distribuição das DCNT, argumentando que a educação formal, frequentemente concluída na idade adulta jovem é fortemente influenciada pela posição socioeconômica da família no início da vida. Em geral, maior escolaridade significa acesso a maior renda e melhores empregos e, portanto, melhores condições sociais e de cuidados com a saúde (Santos, 2011; Malta et al., 2025).

Relevante constatar que os resultados das tendências, segundo escolaridade, ocorrem de forma semelhante na população total: no intervalo temporal analisado, o tabagismo reduziu-se em todo Brasil, mas com menor impacto entre os menos escolarizados. Observa-se também uma redução geral no consumo de feijão, em todas as classes, porém menor entre os que têm pouca escolaridade Destaca-se que o feijão, junto com o arroz, constitui a base da alimentação do brasileiro por razões culturais, por conferir mais saciedade e pelo elevado teor de fibras (Rodrigues et al., 2021).

A prática de atividade física também aumentou no país ao longo dos anos, embora as pessoas com maior instrução, em média sejam três vezes mais ativas. Os autores lembram o quanto tem sido importante a provisão governamental das Academia da Saúde na popularização do acesso e na oferta de equipamentos para exercícios físicos, embora tais programas ainda sejam insuficientes.

O excesso de peso corporal e a obesidade aumentaram no Brasil (Velásquez-Meléndez , 2012; Alves et al., 2016; Malta et al., 2025) e no mundo (WHO, 2024) em todos os segmentos, o que geralmente se associa ao incremento de alimentos ultraprocessados, ricos em calorias, açúcares e gorduras, mais acessíveis e atraentes aos consumidores. Embora o risco maior esteja nas classes mais desfavorecidas. Soma-se a isso, a inatividade física, que apesar de ter melhorado, está muito aquém do desejável.

Igualmente, a recorrência de hipertensão e diabetes se elevou e é mais prevalente entre os menos escolarizados que estão mais expostos aos riscos e às condições socioeconômicas adversas, o que exige direcionamento de esforços assistenciais a essa população mais vulnerável (silva et al., 2021).Como todo estudo da área de saúde pública, este chama atenção para a questão social presente nos dados, na vida das pessoas e na longevidade saudável.

Para ler a edição temática completa acesse

Ciência & Saúde Coletiva, vol. 30, suppl. 2, 2025

Para ler o artigo, acesse

MALTA, D.C., et al. Análise temporal das prevalências de doenças crônicas não transmissíveis, dos fatores de risco e de proteção segundo escolaridade de 2006 a 2023. Ciência e Saúde Coletiva [online]. 2025, vol. 30, suppl. 2, p. 1-13 [viewed 28 November 2025]. https://doi.org/10.1590/1413-812320242911.14172024. Available from: https://www.scielo.br/j/csc/a/gQD3FmtzmYNFvnsYGRBTVdq/

Referências

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MALTA, D.C. et al. Análise temporal das prevalências de doenças crônicas não transmissíveis, dos fatores de risco e de proteção segundo escolaridade de 2006 a 2023. Ciência & saúde coletiva [online]. 2025, vol. 30, e14172024 [viewed 28 November 2025]. https://doi.org/10.1590/1413-812320242911.14172024. Available from: https://www.scielo.br/j/csc/a/gQD3FmtzmYNFvnsYGRBTVdq/

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Como citar este post [ISO 690/2010]:

MINAYO, M.C.S. and GUALHANO, L. Cada vez mais a Saúde Individual e a Saúde Coletiva dependem de nosso Modo de Vida [online]. SciELO em Perspectiva | Press Releases, 2025 [viewed ]. Available from: https://pressreleases.scielo.org/blog/2025/11/28/cada-vez-mais-a-saude-individual-e-a-saude-coletiva-dependem-de-nosso-modo-de-vida/

 

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