Saúde mental dos estudantes de medicina brasileiros

Por Daniela Chiesa, Editora-chefe, Revista Brasileira de Educação Médica, ABEM, Brasília, DF, Brasil

Revista Brasileira de Educação Médica (vol. 44, no. 1), aborda o tema empatia, investigando estudantes, professores e preceptores, reforçando a importância do olhar para quem está ao lado do estudante no processo de aprendizagem. Cenários de prática no internato médico, Residência Médica, avaliação cognitiva e de habilidades, metodologias de ensino-aprendizagem, capacitação profissional, e qualidade de prontuário médico complementam os artigos originais desta edição. Além disso, várias revisões da literatura abordam teste de progresso, telemedicina, educação permanente na estratégia saúde da família e preditores educacionais para fixação de médicos em áreas remotas e desassistidas.

Para contribuir com melhor entendimento sobre a saúde mental de estudantes de medicina, o artigo “Prevalência de fatores associados à depressão e ansiedade em estudantes de medicina brasileiros” teve os seguintes objetivos: estimar a prevalência de escores indicativos de ansiedade, de depressão e de ansiedade e analisar os fatores associados com tais condições em estudantes de medicina. Estudo transversal, com 355 estudantes de uma faculdade de medicina, no Rio de Janeiro. As desordens mentais foram avaliadas com o uso da Hospital Anxiety and Depression Scale (HADS). A magnitude dos transtornos mentais e seus fatores associados foram analisados com a obtenção de estimativas de prevalência e de razão de prevalência. Foram analisados 355 estudantes. Ansiedade foi a condição mais comum (41,4%), seguida de depressão (8,2%) e de depressão e ansiedade simultâneas (7,0%). Depois do ajustamento dos modelos multivariados e considerando tanto gênero quanto idade como variáveis de confusão, nossos resultados mostraram um padrão de risco diferenciado em relação aos três desfechos analisados. O risco de ansiedade aumentou com o fato de se “sentir sozinho”, “ter histórico de acompanhamento psiquiátrico/psicológico antes de ingressar na universidade” e “se sentir moralmente lesado na faculdade”. O risco de depressão aumentou com se “sentir sozinho” e “ter histórico de acompanhamento psiquiátrico/psicológico antes de ingressar na universidade”. Ansiedade e depressão simultâneas foram associadas com se “sentir sozinho” e “ter histórico de acompanhamento psiquiátrico/psicológico antes de ingressar na universidade”. Ansiedade e depressão são comuns em estudantes de medicina. Dessa maneira, um melhor acolhimento e uma redução de situações conflituosas podem ajudar a minimizar estas condições frequentes em escolas médicas, uma vez que impactam não apenas na própria qualidade de vida, como também na forma de lidar com os seus pacientes no futuro.

Imagem: Wokandapix.

O artigo “Sintomas de depressão, ansiedade e estresse em estudantes de medicina e estratégias institucionais de enfrentamento”, teve como propósito estimar a prevalência de sintomas de estresse, depressão e ansiedade dos estudantes de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, associando-os com outros fatores. Estudo transversal com 279 estudantes, distribuídos equitativamente entre os diferentes períodos do curso. Para a coleta dos dados, foram utilizados os seguintes instrumentos: Ficha de Identificação para os dados sócio-demográficos, Inventário de Sintomas de Stress Para Adultos de Lipp (ISSL), Inventário de Depressão de Beck – IDB, Inventário de Ansiedade de Beck (BAI). Foram realizadas análises descritivas a partir da média, desvio padrão e frequência dos dados coletados e a associação entre as variáveis de desfechos e os atributos dos estudantes. Dos estudantes entrevistados, percebeu-se que 66,3% tinham estresse e a maioria estava na fase de resistência (58,4%) com predominância de sintomas psicológicos (42,3%). Em relação à sintomatologia depressiva, 28% dos estudantes apresentam sintomas, sendo que 51,3% apresentam sinais de depressão leve à moderada, 35,9% com sinais de depressão moderada e 12,8% apresentando sinais de depressão severa. No que se refere à sintomatologia ansiosa, 66,3% dos estudantes apresentam sinais de ansiedade em seu grau mínimo e 33,7% apresentam sinais de ansiedade leve, moderada ou severa. Desses últimos, 21,9% têm sinais de ansiedade leve, 10,8% sinais de ansiedade moderada e 1% sinais de ansiedade severa. Diante disso, acredita-se que as instituições de ensino superior devem se comprometer com o desenvolvimento integral dos seus estudantes, apresentando estratégias institucionais para o enfrentamento dessa realidade.

Por fim, “Reflexões sobre a terminalidade da vida com acadêmicos de medicina”, apresenta a morte e o morrer como temas pertinentes ao cotidiano de profissionais de saúde e ao processo de aprendizagem de acadêmicos de Medicina; entretanto, desde os primeiros anos da graduação, o estudante é obrigado a suplantar a concepção holística do ser humano e da vida em prol da supervalorização dos fundamentos técnico-científicos da profissão. Buscou-se conhecer suas percepções através da aplicação de um questionário semiestruturado. Foram entrevistados 60 acadêmicos do curso de Medicina da UNIVÁS. Para análise das respostas, foi utilizado o Método do Discurso do Sujeito Coletivo. Foi suscitada, de maneira preponderante em todos os anos, a concepção de terminalidade como sendo propriamente o “fim da vida”, situação com a qual parcela considerável dos entrevistados (58%) dizia não se sentir preparada para lidar por conta da escassez de reflexões sobre a morte, seus aspectos psicológicos e suas repercussões no contexto médico-acadêmico. Curiosamente, cerca de 16% dos acadêmicos consideravam-se preparados para vivenciar a morte de alguém, mas não para serem intervencionistas no processo; isto é sustentado pelo fato de que os estudantes têm de lidar com o cenário real de transmissão de más notícias, sem antes passar por situações hipotéticas e reflexivas envolvendo o “binômio vida e morte”. Sendo assim, parece necessária a criação de espaços na grade curricular que forneçam apoio não apenas teórico-prático, mas também afetivo das questões envolvendo a terminalidade. A proposta de educação teórico-prática relativa aos cuidados paliativos inserida na grade curricular lapidaria a confiança e atitude dos futuros profissionais frente ao cuidado.

Referências

BRITO, P.C.C., et al. Reflexões sobre a Terminalidade da Vida com Acadêmicos de Medicina. Rev. bras. educ. med. [online]. 2020, vol. 44, no. 1, e033, ISSN: 1981-5271 [viewed 19 June 2020]. DOI: 10.1590/1981-5271v44.1-20190213. Available from: http://ref.scielo.org/gcgdjv

COSTA, D.S. da, et al. Sintomas de Depressão, Ansiedade e Estresse em Estudantes de Medicina e Estratégias Institucionais de Enfrentamento. Rev. bras. educ. med. [online]. 2020, vol. 44, no. 1, e040, ISSN: 1981-5271 [viewed 19 June 2020]. DOI: 10.1590/1981-5271v44.1-20190069. Available from: http://ref.scielo.org/2pj5xz

RIBEIRO, C.F., et al. Prevalence of and Factors Associated with Depression and Anxiety in Brazilian Medical Students. Rev. bras. educ. med. [online]. 2020, vol. 44, no. 1, e021, ISSN: 1981-5271 [viewed 19 June 2020]. DOI: 10.1590/1981-5271v44.1-20190102.ing. Available from: http://ref.scielo.org/g24zqn

Para ler os artigos, acesse

Rev. bras. educ. med. vol.44 no.1 Brasília 2020

Links externos

Revista Brasileira de Educação Médica – RBEM <http://www.scielo.br/rbem>

 

Como citar este post [ISO 690/2010]:

CHIESA, D. Saúde mental dos estudantes de medicina brasileiros [online]. SciELO em Perspectiva | Press Releases, 2020 [viewed ]. Available from: https://pressreleases.scielo.org/blog/2020/06/19/saude-mental-dos-estudantes-de-medicina-brasileiros/

 

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