Maria Cecília de Souza Minayo, Editora-chefe da Revista Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.
Luiza Gualhano, Editora assistente da Revista Ciência & Saúde, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.
O artigo da edição vol. 26, no.8, de Tiago Jessé Souza de Lima e Luana Elayne Cunha de Souza “O suporte social como fator de proteção para as mães de crianças com Síndrome da Zika Congênita” rememora-nos três questões fundamentais: a existência e a situação – frequentemente apagadas ou esquecidas – de crianças com Síndrome de Zika Congênita (SZC); as dificuldades que enfrentam as mães que realizam um cuidado contínuo e permanente sobre elas; e a importância do apoio social de que essas mulheres necessitam. O estudo é fruto de uma pesquisa com 69 mães de crianças com SZC, mulheres muito jovens (média 26,4 anos; entre 16 e 42 anos), residentes no estado do Ceará. A maioria estava desempregada (81%) no momento da pesquisa, sendo que 67,6% indicaram que tinham emprego antes de ter o filho com SZC. Agora apenas 13,4% trabalham. A renda familiar mensal média era de 1,3 salários mínimos. Do conjunto, 52% usavam apenas os serviços públicos de saúde e 34,8% possuíam plano de saúde (LIMA et al, 2021).
Os autores utilizaram vários instrumentos para auferirem a situação das crianças, das mães e para medirem o papel do apoio formal e informal que eventualmente recebem.
As conclusões mostram que as mães de crianças com SZC encaram desafios excepcionais para criar seus filhos, já que eles exigem grande envolvimento por causa de suas necessidades que vão muito além das que apresentam crianças da mesma idade com desenvolvimento típico. A primeira questão que enfrentam é consigo mesmas: a aceitação das condições e limitações dos filhos. Em geral, liderada pela mãe, a família vai se ajustando às dificuldades o que, frequentemente, ocorre com grande sofrimento emocional, conflitos nos relacionamentos, problemas financeiros para fazer frente aos tratamentos, estigmatização, isolamento social, atitudes sociais negativas e consumo de tempo e dinheiro nas consultas aos mais diversos especialistas. Há um visível empobrecimento das mães (67% deixaram seu emprego para cuidar do filho em tempo integral). Assim, o esforço para assegurar o melhor para as crianças com SZC cobra alto preço das mulheres.
Os estudos (SANTOS et al,, 2016; COSTA, 2018; MENEZES et al, 2019) têm mostrado que mães de crianças com SCZ relatam forte estresse, excessiva carga de cuidado, sintomas depressivos, níveis elevados de ansiedade, fadiga, perda de qualidade de vida e piora na saúde mental (SOUZA et al, 2018). Ademais, além do peso e da pressão de um cuidado que é permanente e contínuo, as mães vivenciam um profundo preconceito patriarcal que lhes atribui um papel naturalizado e quase exclusivo de cuidar dos filhos e da casa. Do ponto de vista médico, no caso das vítimas da zika, existe um componente de grandes incertezas, pois a síndrome tem sido pouco estudada. No entanto, os resultados negativos para as mães não podem ser simplesmente explicados pelos efeitos de criar um filho com SCZ, pois as formas de enfrentamento se diferenciam entre elas, dependendo das condições da criança e das características sociopsicológicas de cada uma, de sua percepção de autoeficácia, de suas estratégias de resistência e de fatores contextuais, particularmente, se existe suporte social, emocional e informativo provido por familiares, amigos e por profissionais de saúde.
O suporte social pode ser definido como a prestação de assistência emocional, informativa e instrumental que um indivíduo recebe a partir de pessoas significativas. Estudo realizados com pais e mães de crianças com condições crônicas têm apontado que o suporte social informal desempenha um papel importante, ao ajudar as mães a reduzirem os sentimentos de isolamento e desamparo, a melhorarem sua satisfação com a vida e a promoverem sua saúde mental. O suporte social formal desempenha importante papel na predição da autoeficácia materna, ou seja, nas crenças em que as mães têm sobre suas habilidades de prover cuidados aos filhos, contribui para melhorar a saúde mental delas e para minorar seus níveis de depressão e estresse. Esse tipo de apoio também ajuda a aumentar a autoestima e a satisfação com a vida.
Este artigo inédito em relação ao apoio social às mães de crianças com zika, nos ajuda a pensar que a saúde de uma população é coletiva porque não se resolve individualmente; que doenças infecciosas extremamente danosas permanecem com seus deletérios efeitos entre nós, e que podemos fazer mais para que o padrão de saúde brasileiro se eleve por meio da ciência, da solidariedade e da compaixão.
Referências
COSTA, P.R.L.A. Percepção de qualidade de vida de mães de crianças portadoras de síndrome congênita associada ao zika vírus. Tese de Mestrado em Saúde do Adulto. Universidade Federal do Maranhão; 2018.
MENEZES, A.S.S., et al. Microcefalia relacionada ao vírus Zika e dinâmica familiar: perspectiva da mãe. Avances en Enfermería. 2019; vol. 37, no. 1, pp. 38-46.
SANTOS, O.S.J.G, et al. Anxiety, depression, and quality of life in mothers of newborns with microcephaly and presumed congenital Zika virus infection. Archives of Womens Mental Health. 2016, vol. 19, no. 6, pp. 1149–1151.
SOUZA, L.E.C. Mental health of parents of children with congenital Zika Virus Syndrome in Brazil. Journal of Families and Children studies. 2018, vol. 27, pp. 1207–1215.
Para ler o artigo, acesse
LIMA, T.J.S.; SOUZA, L.E.C. O suporte social como fator de proteção para as mães de crianças com Síndrome da Zika Congênita. Ciênc. saúde coletiva [online]. 2021, vol. 26, no. 8 [viewed 8 September 2021]. https://doi.org/10.1590/1413-81232021268.04912020. Available from: http://ref.scielo.org/mrjcs5
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