Mulheres jovens e dependentes financeiramente são maioria entre vítimas de agressão doméstica

Por Talita Lima de Castro, Perita Odontolegista do IML de Porto Velho, RO, Brasil

Pesquisadores da área de Odontologia Legal da UNICAMP realizaram um estudo que traçou o perfil da vítima de violência doméstica submetida a exames de lesão corporal no Instituto de Medicina Legal do Espírito Santo. Segundo a pesquisa intitulada “Violência contra a mulher: características das lesões de cabeça e pescoço”, publicada na RGO – Revista Gaúcha de Odontologia (v. 65, n. 2), as vítimas são jovens, declaram-se solteiras e são financeiramente dependentes. A grande maioria é agredida na face e tem como principal agressor o seu companheiro ou marido. As lesões físicas sofridas são, no geral, de caráter temporário, contudo, dada a região, podem ter como consequência efeitos devastadores como psicológicos, sociais e funcionais.

O levantamento foi realizado em laudos de exames de corpo de delito relacionados a lesões corporais causadas por violência doméstica, familiar ou conjugal, entre os anos de 2004 e 2008, dois anos antes e dois anos depois da Lei Maria da Penha e revelou um aumento no número de exames periciais realizados, após a promulgação da lei.

A pesquisa ressaltou também um elevado número de lesões bucais e craniofaciais nas mulheres examinadas, já que a proeminência da face e sua vulnerabilidade acabam por torná-la alvo frequente em brigas e conflitos corporais. De acordo com o trabalho, tal região demanda uma atenção especial durante a perícia, visto que suas estruturas têm grande valia em funções vitais como respiração, mastigação, deglutição e fonação.

Nesse contexto, os autores chamam a atenção para o fato de que a ausência de odontolegistas no quadro funcional de um Instituto Médico Legal pode levar a uma subnotificação das lesões presentes no complexo maxilomandibular e à presença de desacertos na descrição das injúrias, o que culmina em uma incorreta punição ao agressor. Além disso, destacam a importância social da caracterização das vítimas e das agressões sofridas, a fim de que a violência de gênero seja enfrentada no Brasil, com a implantação de políticas públicas que priorizem ações e práticas de acolhimento e reconhecimento desse tipo de violência (SILVA; PANHOCA; BLACHMAN, 2003; OLIVEIRA, et al., 2015).

A violência de gênero, aquela praticada contra a mulher baseada na condição de inferioridade de seu gênero, pode se manifestar por meio de qualquer ação ou omissão que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico, ou ainda dano moral ou patrimonial (BRASIL, 2006), e sua ocorrência é reconhecida pela Organização Mundial da Saúde como um problema de saúde pública. As lesões em cabeça e pescoço são um desafio socioeconômico de importante magnitude e seu enfrentamento demanda ações multidisciplinares e práticos, uma vez que sua determinação é diferente para cada causa externa estudada.

Referências

Lei n. 11.340, de 7 de agosto de 2006. Cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF. 2006 [viewed 09 August 2017]. Available from: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11340.htm

OLIVEIRA, M. C. A., et al. Characterization of women victims of violent death in a metropolitan area of Northeast Brazil. RGO, Rev. Gaúch. Odontol. [online]. 2015, vol. 63, no. 4, pp. 439-445 [viewed 10 August 2017]. DOI: 10.1590/1981-863720150003000102883. Available from: http://ref.scielo.org/ywjjzs

Organização Mundial da Saúde. Estudio multipaís de la OMS sobre salud de la mujer y la violencia doméstica [online]. WHO. 2005 [viewed 10 August 2017]. Available from: http://apps.who.int/iris/handle/10665/43390

SILVA, O. M. P, PANHOCA, L. and BLACHMAN, I. T. Traumatismos Faciais Causados pela Violência Ocorrida na Cidade de São Paulo, ao Longo do Século XX. Rev. Odontol. da UNESP. 2003, vol. 32, no. 2, pp. 81-85.

Para ler o artigo, acesse:

CASTRO, T. L., et al. Violence against women: caracteristics of head and neck injuries. RGO, Rev. Gaúch. Odontol. [online]. 2017, vol. 65, no. 2, pp. 100-108 [viewed 10 August 2017]. DOI: 10.1590/1981-863720170002000013245. Available from: http://ref.scielo.org/xnkm8h

Link externo

RGO – Revista Gaúcha de Odontologia: <http://www.scielo.br/rgo>