Violência contra gestante golpeia mãe, bebê, família e sociedade

Maria Cecília de Souza Minayo, Editora-chefe da Revista Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.

Luiza Gualhano, Editora Assistente da Revista Ciência & Saúde, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.

Logo do periódico Ciência & Saúde ColetivaNo artigo escrito por Silva et al (2022), Violência por parceiro íntimo na gestação: um enfoque sobre características do parceiro publicado na edição v.27, n.5 de 2022 da Ciência & Saúde Coletiva, os autores ressaltam os efeitos perversos das violências sofridas durante a gestação para a saúde da mulher e do filho que está em seu ventre ou é recém-nascido, em geral, praticadas por maridos ou companheiros. O foco do trabalho, além dos dados que mostram a relevância do tema, ressalta as características socioeconômicas e comportamentais do parceiro agressor. Este estudo transversal e analítico foi feito numa maternidade do estado do Espírito Santo com 327 puérperas, utilizando um instrumento metodológico, adotado pela Organização Mundial da Saúde, que permite rastrear o tipo de agressão e o perfil do agressor.

A Organização Mundial da Saúde (2002) caracteriza a violência por parceiro íntimo como qualquer comportamento que cause danos mentais, físicos ou sexuais àqueles que fazem parte da relação, incluindo abuso psicológico, agressão física, coerção ou relações sexuais forçadas. Estudos internacionais e nacionais nesse sentido evidenciam que as mulheres são as mais frequentes vítimas (LINDNER et al, 2015). Dados dos Estados Unidos, por exemplo, estimam que 36,0% das americanas vivenciam violência cometida pelo parceiro durante sua vida (SMITH et al, 2018). No Brasil, importante pesquisa realizada em 15 capitais e no Distrito Federal mostra forte prevalência de violência psicológica que varia de 61,7% em Campo Grande a 85,6% em Belo Horizonte. E de violência física que chega a 13,2% em João Pessoa e 34,7% em Belém (REICHENHEIM et al, 2006). Em Vitória, verificaram-se prevalências ao longo da vida de 57,6% de violência psicológica, 39,3% de violência física e 18,0% de violência sexual. Os autores ressaltam que as formas de violência se sobrepõem em 11% dos casos estudados (Silva et al, 2022).

Não há consenso na literatura científica se a gestação atua como fator de risco ou proteção à violência. Mas a pesquisa encontrou que na gravidez aumenta a incidência de violência psicológica e reduzem-se as agressões físicas. No entanto, em 9,7% dos casos, os abusos tiveram início na gravidez. As repercussões mais recorrentes ocorrem com o recém-nascido: prematuridade, baixo peso ao nascer, óbito fetal e neonatal; e para a mulher apresentam-se sintomas depressivos, transtornos de estresse pós-traumático, interrupção precoce da amamentação exclusiva e aborto espontâneo (LEITE et al, 2020).

Os parceiros agressores de mulheres grávidas ou puérperas são, em maioria, consumidores persistentes de bebida alcoólica; não são pais biológicos da criança em gestação; são controladores e ciumentos. Esse é o perfil dos que mais cometem violência psicológica. Os agressores que batem nas mulheres grávidas, em sua maioria não trabalham e se recusam a usar preservativo. Puérperas com parceiros que persistentemente não usam preservativo tiveram nove vezes mais prevalência de violência sexual durante a gestação. Outros fatores associados a bater ou humilhar as gestantes são ciúmes, suspeitas de infidelidade, recusa de relação sexual pela mulher, divergência na educação dos filhos e paternidade não planejada. A maioria dos parceiros têm idade até 40 anos (89,3%).

A conclusão é que, entre homens jovens continuam vivas as marcas do patriarcalismo, cujo modelo hegemônico de masculinidade é calcado nas ideias de domínio, virilidade, força e poder, inclusive sobre as mulheres. Porém, segundo Simone Beauvoir em O Segundo Sexo (1970), a mulher não pode se eximir dessa naturalizada cultura milenar de dominação, pois ela também é responsável pela construção social da identidade masculina, quando atua consciente ou inconscientemente para reforçar o machismo na educação dos filhos.

Leia mais

BEAUVOIR, S. O segundo sexo: fatos e mitos. São Paulo: Difusão Europeia de Livros, 1970.

LEITE, F.M.C., et al. Implicações para o feto e recém-nascido da violência durante a gestação: Revisão Sistemática. Revista de Pesquisa Cuidados é Fundamental Online [online]. 2020, vol. 11, no.2, pp. 533 [viewed 30 May 2022]. https://doi.org/10.9789/2175-5361.2019.v11i2.533-539. Available from: http://seer.unirio.br/cuidadofundamental/article/view/6431

Lindner, S.R., et al. Prevalência de violência física por parceiro íntimo em homens e mulheres de Florianópolis, Santa Catarina, Brasil: estudo de base populacional. Cadernos de Saude Pública [online]. 2015, vol. 31, no. 4, pp. 815-826 [viewed 30 May 2022]. https://doi.org/10.1590/0102-311×00159913. Available from: https://www.scielo.br/j/csp/a/K6kk3twLw5JNTkDRYpq4jBm/

Reichenheim, M.E., et al. The magnitude of intimate partner violence in Brazil: portraits from 15 capital cities and the Federal District. Cadernos de Saúde Pública [online]. 2006, vol. 22, no. 2, pp. 425-437 [viewed 30 May 2022]. https://doi.org/10.1590/s0102-311×2006000200020. Available from: https://www.scielo.br/j/csp/a/NJDtv5CHbLsKF7cvnBsQt3f/

SMITH, S.G., et al. The National Intimate Partner and Sexual Violence Survey (NISVS): 2015 Data Brief – Updated Release. Atlanta: CDC, 2018.

WHO World Health Organization. World report on violence and health. Geneva: WHO: 2002.

Para ler o artigo, acesse

SILVA, R.P., et al. Violência por parceiro íntimo na gestação: um enfoque sobre características do parceiro. Ciência & Saúde Coletiva [online]. 2022, vol. 27, no. 5, pp. 1873-1882 [viewed 30 May 2022]. https://doi.org/10.1590/1413-81232022275.06542021. Available from: https://www.scielo.br/j/csc/a/9cnkvWyhzhr6dLTYVfzc4MJ/

Link(s)

Para ler a edição temática completa acesse: https://www.scielo.br/j/csc/i/2022.v27n5/

Ciência & Saúde Coletiva: http://www.cienciaesaudecoletiva.com.br

Ciência & Saúde Coletiva – Redes Sociais: Facebook | Twitter | Instagram

Ciência & Saúde Coletiva – CSC: http://www.scielo.br/csc

 

Como citar este post [ISO 690/2010]:

MINAYO, M.C.S. and GUALHANO, L. Violência contra gestante golpeia mãe, bebê, família e sociedade [online]. SciELO em Perspectiva | Press Releases, 2022 [viewed ]. Available from: https://pressreleases.scielo.org/blog/2022/05/31/violencia-contra-gestante-golpeia-mae-bebe-familia-e-sociedade/

 

Leave a Reply

Your email address will not be published. Required fields are marked *

Post Navigation